13.2.09

#13 Queridos Bandidos

Lá vamos nós. De interessante, para esse mês tenho alguns babilaques a dizer. Por essa terça-feira, dia 10, estive na tv brasil, no atitude.com, fui debater cultura inútil. É isso mesmo. O tema do programa era cultura inútil. De convidados fomos eu; um figurão chamado Jone Brabo, que tem um programa de humor trash na tv a cabo; e um jornalista, Silvio Essinger, que escreveu o Almanaque anos 90 pela editora Agir.

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A internet foi parte grande do debate, a questão da qualidade dos sites e das informações veiculadas foi carro-chefe. A qualidade, na acepção corriqueira do termo é juízo de valor, é igual dizer se é bom ou mau. E aí o que propus foi o seguinte, e coloco isso em debate aqui: para os nossos tempos precisamos substituir a palavra qualidade pelo composto afinidade com.

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O assunto do programa foi como eu disse cultura inútil, e foi por aí que eu calquei a argumentação: Primeiro: antes de tudo, cultura é bem mais um modo relacional, um ferramental com o qual nos relacionamos com as coisas, com o mundo, conosco. Assim, não há como haver cultura inútil, posto que sendo gente, seja lá como, um cara usa a cultura dele para isso, para se relacionar. A cultura é a própria relação.

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Segundo: Nos tempos em que consumo é a ordem: consuma. O modus operandi corrente não incentiva a reflexão, nem a invenção, coisas que a gente usa desde que se sabe para fugir do tédio e para viver com menos problemas. O modus operandi corrente incentiva a televisão e a rede mundial, duas ferramentas culturais que substituem a reflexão e a invenção em parte sob uma palavra: entretenimento.

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O entretenimento acaba com o tédio. E quanto mais entretenimento menos reflexão. Mas a gente cria, tem vontade de aprender coisa nova, e aí liga a tv e descobre quantos dentes o ornitorrinco tem. Descobre quantos caras já pularam juntos de um precipício sem paraquedas, descobre tudo que não precisávamos descobrir e o repertório de absurdos e exóticos aumenta de forma inacreditável.

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É problema? Talvez seja. É inútil? Talvez não. O entretenimento move não tenho idéia de quantos bilhões de dólares por ano. Mas e aí? É cultura de qualidade? Daí a proposta. Qualidade é qualidade, mas isso segundo quem?

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(Exemplo) Faz anos que acompanho os debates sobre educação, e toda vez que a palavra qualidade é citada nos assuntos educacionais, todos concordam, fantástico. E nunca vi ninguém colocando um o que é isso? para essa qualidade que todos citam e todos concordam e se utilizam dela para defender e executar as propostas e planos mais sinistros.

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Digo isso porque: O paradigma da utilidade, do utilitarismo, a ditadura do ponto de vista, as idéias de juízo de valor, as teorias europeizantes do mundo, tudo isso é século XIX. Para dominar a África, colonizar a Ásia tudo isso virou discurso corrente. Mas século XIX, gente, é para enterrar.

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No meio do século passado é posto em cena o discurso da cultura ao diálogo, a relatividade, o relativismo, o multiculturalismo. O discurso da promoção da diversidade ganha força, é fraco ainda, o século XIX ainda tem força, mas teoricamente já foi superado.

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Justificar

E a democratização nos meios de comunicação (do consumo, não da produção dos conteúdos, tirando os últimos quinze anos) nos trouxeram de brinde: a cultura inútil, que sempre existiu, mas tem crescido e vai crescer (cago de medo que isso se torne o paradigma vigente, caramba, se isso vira estilo, no futuro os grandes escritores vão ser os escritores de auto-ajuda, credo).

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Cultura inútil serve como documento histórico para saberem no futuro o que fazíamos no nosso dia-a-dia, serve para registrar a história da cultura, serve para ir ao cabeleireiro, mas quando a gente troca isso por discutir o mandato do Eduardo Paes, ou do Kassab, aí é perigoso.

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Ah! e porque afinidade com? Porque caiu o discurso majoritário, gente. Caiu a idéia de que um sensor sábio vai falar o que é pra consumir. Falar que uma coisa tem qualidade é falar: gostei. É falar tive afinidade com ela. Tenho afinidade com a casa. Queridos e queridas, agora, delirem. Até mês que vem.

10 comentários:

Victor Meira disse...

Boa negó!

Isso aqui tem muita conversa com o penúltimo post do Entre Águas.

Ó, povo, é pra ver: http://heykpimenta.blogspot.com/2009/01/pausa-pro-puxo-de-orelha-ii.html

Inevitavelmente pensei na arte quando foi posto aí no texto o conflito QUALIDADE e AFINIDADE-COM. Se antes existia algum parâmetro que ditasse qualidade artística, agora não tem nada disso (, gente!). Arte é expressão, e é infinita, é possibilidade.

Conversa boa.

Abraçó, Heykó.

Gabriel Barbosa (@umgabriel) disse...

qndo li pensei em novas possibilidades de organizacao (nao sei se cabe essa palavra) que se pode ver no achamado underground. há sim opcoes alternativas de arte, entretenimento, 'cultura', o que for. com certeza nao é e acho que nunca foi de massa. devemos pensar em como podemos fazer outros tipos de cultura se massificarem. sei lá...

william galdino disse...

A conversa é boa Heyk, papo que rende, ontem aqui na torres a conversa passou por muito do que tá escrito aqui.
tudo ao mesmo tempo agora.
Um leque imenso de possibilidades, boas e ruins.
Entretenimento, passatempo...
muta coisa só na epiderme
Vamos marcar uma cuba e botar esse papo pra frente.até.

Rachel Souza disse...

Hahaha é a pauta recorrente de minhas conversas com o Paulo (Gaja...). Tenho me entristecido profundamente com umas posturas que encontrei/encontro pelo caminho. Tá certo que a verdade é plural e o caminho da salvação mental é relativizar,relativizar e relativizar... Mas cansa,viu? Ah,depois a gente conversa melhor sobre isso. Tô marcando (assim,no gerúndio!rs) um churrasco de panela com Camarada e uma galera aí.Te aviso.

Rachel Souza disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Caco Pontes disse...

em tempos de cool-tura in-util, passando na porta do inferno, nem sempre desvia-se pro outro lado.

Tulio Malaspina disse...

Muito bem, essa é casca! hauahuaua

Começo por concordar com a ideia de que nós devemos deixar a palavra "qualidade" de lado, já que essa é, por si só, pessoal e intransponível.

Durante a leitura do texto pensei muito sobre a cultura moderna, sobre Andy Warhol principalmente. Deixo claro aqui que não tenho afinidade com(funcionou bem) sua arte, e que não vejo outra utilidade para ela se não a reclicagem. Porem, ao observar o mundo em que vivemos, vejo que Andy foi realmente importante para o pensamento cultural de nossos companheiros modernos, visto que a quantidade de artes "non-sense" cresce a cada dia (MTV FDP!).

Se antes existia algum parâmetro de qualidade artística, esse era também opressor de tantas outras. Como a Raquel colocou, a verdade é plural. Assim, com a minimização dos espaço fisíco pela comunicação, os pequenos grupos outrora oprimidos criam seus núcleos e melhoram seu relacionamento como um todo.

Enfim, linkando com o puxão de orelha essa é, provavelmente, a democratização da cultura; micronúcleos de cultura. Qualquer cultura pois nenhuma é tão inútil que deva ser queimada na fogueira pelos tão iluminados artistas ditadores da QUALIDADE. Nem mesmo Andy ou big brother.

A conclusão é que a democratização da cultura não está no meio de comunicação em sí, e sim na possibilidade de todos poderem expressar sua própria cultura, sejá ela de massa (Big Brother) ou revolucionaria (feijoada e capoeira).

Grande abraço!!

Anônimo disse...

Muito bem discutido, Heik. Pena mesmo que naquele programa de cultura inútil que é o da TVE, com aquela maníaca por improvisos fúteis que é a apresentadora, ou melhor, a climatizadora (coitada, ela é vítima do sistema, como todos nós, é rapidinha pra todas as coisas, e eu, menor ainda, dando uma crítica de blogg nela). Triste ou Resistente TVE? São as maneiras de refletir; poderia haver lá, como essas, aqui, sobre o texto inicial do Heik; torcemos gaiatos, sem sistema, poetas. Também um pouco pra isso os programas ali, bem intencionados que são, podiam aumentar em tempo e tamanho, como faz sem parar nas academias o nosso amigo supremo Roberto Reder (o Jonnhy Bravo, que não vi no programa, mas que já posso imaginar como esteja, musculosamente carinhoso, sempre; um lutador muito mais do que resisistente, por isso mesmo está não só na TVE e na Altentiva, como fazendo risadas de sábado na patroa Globo, comendo ela, programa ainda pago). No mais, a falta de Educação é bem por aí, como a acusada no texto pelo zinabrista Heik (zinabristas, nós, aqueles que estão sempre manobrando pra não dobrar ninguém, na maciota, no mérito dos argumentos pró e contra, livres, é tal, o blogg). Um abraço em todos os propositores, leitores e refletores, Rod Britto.

Heyk disse...

Bom, meus caros,

A questão é rude mesmo. E nem sempre clara.

O obama ganhou as eleições nos estados unidos pela internet, dizem. Pô, bem que a gente podia eleger o zé do Caixão, ou o Gugu pra algua coisa, né? Desculpem ter posto esses dois caras no mesmo patamar. não tem nada a ver.

Mas se o Obama ganha por causa da internet, porque não nós?

E dana-se o underground. Cultura indígena é under ground? Povo cigano é under ground? Se for, concordo: viva o underground!

Temos esse programa na tve, como disse o rod: puta que pariu, como é rápido e devagar ao mesmo tempo aquele programa. Os temas são jóia, às vezes rolam uns debates bons, mas na média a turma é desinformada e quase reproduz o senso-comum, só dá uma guaribada no senso-comum pra não parecer senso comum.

Essa é a questão. Os temas que são debatidos pela contemporaneidade são ótimos. O problema é pra onde desenbesta esse debate. Os argumentos usados nos debates de tema legal são argumentos de senso-comum.

E aí tá a merda: o que debater?: simples, como sempre debateremos o que nos apoquenta, o que nos incomoda, o que nos tira o sono.

ok.

Mas temos que debater num retorno constante às leituras, às experiências práticas e pessoais, e sempre: tentando o distanciamento da coisa:

Como brunoi cordeiro, gramsci também fala: o intelectual orgânico (do local , com formação local) pode não perceber o que está acontecendo, ele tem que estar sempre em confronto com linhas de pensamento, teóricas, religiosas, a porra toda, que não sejam as dele. Isso ajuda a olhar com distanciamento. Olhar de cima, olhar por outro lado, olhar com outros olhos.

Olhar com outros olhos. Surpreender-se com o cotidiano, pode ser ferramenta pra pensar o dia.

Danam-se os porões das boates.

Tulio Malaspina disse...

Sabe que esse papo funciona mesmo?