'“Cada coisa em mim ardia”, ardia como ficção, como oferenda culinária de mãe, como rebanho entorpecido no temporal, como seios de viúva. Eu, do alto de meus trinta e sete anos de dentes alvos e bem cuidados, sentia o direito à covardia e à bem- aventurança de pizza fria de anteontem. Meu filho, de juventude insuportável, assumiria em breve os magros negócios da família e poderia então, comprar sua própria droga, dever seu próprio aluguel e produzir sentimentos legítimos em criaturas tão despreparadas quanto ele. A vida tem seu jeito de resolver as coisas, embora seja bestialmente humano, tenho momentos de lucidez, aceito a falta de coerência das desimportâncias. Numa ocasião tive o desejo de ser coveiro, de ser poderoso. Somente eu seria agente, o outro calado e inerte. Sempre. E desaguaria meus traços de vida em pessoas feito eu. Seguiria assim, acompanhando a dissolução da matéria humana, gradativamente menos interessante. Eu, um quase-ser, como tantos outros vagando por aí. Mas enquanto planejava o destino em silêncio, os acontecimentos fluíam. Abri a porta da cozinha pra ela e me fudi. Ela perguntou as horas e me ofereceu queijo. Não despertou em mim grandes sentimentos, mas seus peitos eram lindos. Me descontrolei e fiz um filho. Por cima eu perguntava “hoje começa nossa história?” Ela com seu gemido prateado, parecia prever, parecia saber. E riu. A partir de então passei a lamber nucas desconhecidas com a emoção de um herói, com a soberba da ereção. Minha nudez não mais faz corar, meus pêlos são ralos e minhas secreções libidinosas me dão a dimensão do indivíduo que sou. Fui obrigado a blefar seriamente.
#Foi mal o atraso do post,tava viajando por aí.
Perdão
-
Quisera ver-te em suplício
mas logo me dou conta
– e, de tudo, logo isso! –
que tu és eu.
Sou eu quem me amedronta.
Quisera acusar-te de tudo...
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